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Moda não é o mesmo que vestuário. Vestuário, como afirmam Fernandes e Pedrozo, é aquilo que apenas “cobre e protege o corpo”, cumprindo a simples função de vestir. A forma do vestuário pode até se aperfeiçoar ao longo do tempo por meio da tecnologia ou por ressignificação de conceitos, mas tal aperfeiçoamento terá sempre como objetivo a funcionalidade da vestimenta, útil e singela. Já a moda “representa o espírito do tempo, a partir dela são sentidas as primeiras mudanças políticas, sociais, culturais e econômicas” (FERNANDES, PEDROZO, 2015, p. 389-405). Para Knoll e Echeverría, a moda tem sido a linguagem de homens e mulheres em diferentes épocas da história (KNOLL, ECHEVERRÍA, 2015, p.9-10).

 

A moda está atrelada à inovação e advém do impulso de substituir o velho pelo novo, de romper padrões e paradigmas; é evolução nos conceitos e expressão do espírito individual e coletivo da sociedade. A moda é efêmera e seus artigos combatem a si mesmos, e assim, afasta-se o caráter utilitário dos produtos, pois a moda pouco ou nada tem de utilitarista, porque a criação das tendências e consequentemente modelos mais novos não afastam a pura e simples utilidade dos anteriores.

 

No mercado da moda, “bem antes de serem usadas as vestimentas ficam obsoletas. A indústria tem interesse em provocar a obsolescência vivendo um ritmo frenético de inovação” (MACKAAY, ROUSSEAU, 2010, p.350). E para mantê-lo, existe um certo grau de tolerância à cópia, chamada de inspiração (MACKAAY, ROUSSEAU, 2010, p.349-350; RAUSTIALA, SPRINGMANN, 2006, p.1687, ESTEVES, 2016), a qual é diferenciada da cópia servil por meio da análise da originalidade da obra, pelo princípio do contributo mínimo.

 

Diante do cenário econômico nacional e internacional, o fato de o mercado da moda estar em ascensão é fator tornando evidente a importância do poder desta indústria, o que pode ser atribuído principalmente à abrangência sociocultural, movimentando complexa estrutura organizacional a fim de ser permitido o tráfego globalizado, não só das mercadorias, como também das criações.

 

Para que a prática do Direito seja eficaz à moda, principalmente no Brasil, é necessário um estudo aprofundado do setor em si e, também, de matérias correlatas, como a Economia e o comportamento dos fatores que permeiam o mundo criativo. O estudo da fashion law busca suprir a ausência de aprofundamento legislativo e doutrinário no mercado das criações e de produção relacionado à indústria da moda, a fim de que os interesses dos agentes econômicos envolvidos sejam melhores administrados pelo ordenamento jurídico (CABRERA, SILVA, 2014).

 

São a doutrina e os contratos privados os elementos os quais irão, em um primeiro momento, ditar as regras dos negócios atrelados ao mercado da moda. Em segundo lugar, as técnicas de resolução alternativa de conflitos e, em último lugar, o Poder Judiciário. Obviamente há questões a serem reguladas pelo Estado, como, por exemplo, a relativa ao trabalho escravo, devendo o Direito buscar prevenir este tipo de situação, dentro da indústria moderna, sem a necessidade de intervenção estatal.

 

Kolsun e Gimenez fazem uma reflexão sobre o porquê da existência do estudo da fashion law, assim como a entertainment law e a sports law, originárias dos Estados Unidos, considerando as peculiaridades destas indústrias e as grandes cifras e o sigilo que os negócios nestas áreas demandam, concluindo a fashion law ser “a business-focused combination of legal disciplines”, ou seja, o estudo de várias disciplinas legais, focadas no mercado da moda (JIMENEZ, KOLSUN, 2016, p. 03, ROSINA, 2014).

 

O aprofundamento das pesquisas relacionadas à especificidade do negócio faz com que a própria indústria evolua. Porquanto, com isso, o Direito opera com conhecimento mais sofisticado na área, resultando em contratos mais bem adequados à realidade do negócio e aos possíveis eventos futuros, assim como uma jurisprudência mais próxima do resultado esperado pelas partes envolvidas no contexto dos litígios.

 

O crescimento deste mercado e as peculiaridades do setor fazem com que o estudo jurídico multidisciplinar seja o mais adequado para a defesa dos interesses e direitos dos agentes econômicos envolvidos no negócio. Ou seja, por mais que exista a necessidade de um aprofundamento em determinada matéria para ser bem solucionada rapidamente, é importante saber como tal questão específica afeta o mercado como um todo.

 

Ademais, neste mercado não estão envolvidas somente grandes companhias de moda. Existem designers, fotógrafos, modelos, trabalhadores, fornecedores, distribuidores, editores, representantes, o Estado e até mesmo o meio ambiente envolvidos no setor (KOLSUN, GIMENEZ, 2016, p. 03, ROSINA, 2014), sendo todos considerados agentes econômicos deste universo.

 

Não só as questões relacionadas à propriedade intelectual, mas também a contratos, publicidade, importações e exportações, dentre outras, são de suma importância para os negócios da moda e estão presentes neste ramo do Direito.

 

Quanto ao ramo da propriedade intelectual, Echeverría e Knoll explicam que, tanto no âmbito nacional quanto internacional, o Direito não é apenas o conjunto de regras reguladoras dos interesses, dos valores e dos caminhos para a resolução dos conflitos e para o mercado, mas também trata das questões desprovidas de um regime internacional unificado, como é o caso da proteção da criatividade e de suas formas de apresentação (ECHEVERRÍA, KNOLL, 2015, p.

 

10). Schumpeter afirma as inovações as responsáveis pelo início das mudanças econômicas, fazendo com que os consumidores adquiram novas necessidades e não ao contrário: as pessoas não sentem necessidade de algo que não sabem que existe. É por meio das novas criações que os consumidores são “ensinados a querer coisas novas ou coisas que diferem em um aspecto ou outro daquelas as quais tinham o hábito de usar”, o que gera desenvolvimento econômico por impulsionar o consumo e, consequentemente, a criatividade e o mercado (SCHUMPETER, 1997, p. 69-83).

 

Afirmam Giacchetta e Santos que “o desenvolvimento da Economia há muito tempo tem sido atrelado à capacidade da indústria agregar valor aos bens produzidos para, posteriormente, revendê-los no mercado” (GIACHETTA, SANTOS; CURY, ROSINA, 2018). A indústria da moda produz bens tangíveis, como, por exemplo, roupas, acessórios, perfumes e cosméticos, cuja intangibilidade oriunda da criatividade, da cultura e do talento, quais sejam, as tendências e as marcas, agregam-lhes valor econômico.

 

A intangibilidade geralmente advém das figuras criativas da companhia (ARAÚJO; CURY, ROSINA, 2018, p. 131-154), as quais podem, ou não, serem aquelas cujo nome é dado à marca. Elas são as responsáveis “pelas características criativas específicas que, pelas lentes do mercado, conferirão, ou não, determinado valor à marca, chamada de identidade criativa”. E é por isso que as companhias de moda buscam investir em inovação por meio da criatividade (CURY, ROSINA, 2018).

 

No livro Contratos na Fashion Law  você verá uma análise sobre as formas de proteção das criações de moda por meio do Direito Autoral, cuja lei específica é a Lei de Direitos Autorais, de nº 9.610/98, e da Propriedade Industrial, lei nº 9.279/96, assim como das ilicitudes que abrangem esta esfera, a fim de que se possa entender o papel dos contratos neste âmbito. E na segunda parte será analisada a função dos contratos na esfera jurídica da fashion law, as especificidades de cada um dos principais contratos que permeiam a indústria, a colaboração como característica comum a todas as operações dos negócios, e casos exemplificativos.

 

Referências bibliográficas

 

CURY, Maria Fernanda; ROSINA, Monica Steffen Guise. Fashion Law, Direito e Moda no Brasil. RT, 2018.

 

ECHEVERRÍA, Pamela; KNOLL, Susy Inés Bello. Derecho y Moda. 2015.

 

ESTEVES, Maurício Brum. Inspiração ou Plágio? Disponível em: <http://www.mauricioesteves.com.br/2016/04/inspiracao-ou-plagio-jornal-estado- de.html. 2013>. Acesso em: 27 ago. 2018.

 

FERNANDES, Ligia Durrer; PEDROZO, Têmis Chenso da Silva Rabelo. Fashion Law: a proteção jurídica da moda. Revista de Direito Empresarial, v. 7, p. 389–405, Jan–Fev 2015.

 

JIMENEZ, Guillermo; KOLSUN, Bárbara, Fashion Law: Cases and Materials.North Carolina: Carolina Academic Press, 2016.

 

ROSINA, Mônica Steffen Guise. Fashion Law é a nova moda do Direito. Revista Observatório Itaú Cultural, São Paulo, n. 16, jan/jun 2014, p. 106–117. Disponível em: <http://d3nv1jy4u7zmsc.cloudfront.net/wp- content/uploads/2014/06/ OBSERVA TOR IO16_0.pdf.>. Acesso em: 29 ago. 2018.

 

SCHUMPETER. Teoria do Desenvolvimento Econômico, uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Tradução de Maria Sílvia Possas. São Paulo: Nova Cultural, 1997.

 

 

LETÍCIA SOSTER ARROSI

Sócia proprietária do escritório Arrosi Advocacia Empresarial

Atuante em Santa Catarina e Rio Grande do Sul

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